CANADAIR, A SALVAÇÃO DIVINA... SE FOR NO TOPO DA SERRA - Como a pressão dos media ditou a gestão estratégica de um incêndio florestal (e não deveria)

 



Opá, eu juro que tentei andar calado sobre isto.
Mas isto chegou a um ponto que, até para alguém que não seja um Operacional minimamente experiente em incêndios florestais, o que estamos a assistir é uma autêntica barbárie de gestão estratégica.
Como assim os media agora ditam os meios que se utilizam nos incêndios florestais? Enviamos Canadair para qualquer lado porque fica bonito para as televisões? Mas que gestão é esta? Agora se os meios de comunicação social acharem adequado utilizar um submarino na Peneda-Gerês, alguém vai acionar o NRP Arpão (desculpem colegas da Marinha se não é assim, tive de ir pesquisar ao tio Google) para a barragem do Touvedo ou do Lindoso? SURREAL.

Bem, agora que desabafei (ufa, quase rebento...) já podemos enquadrar no tema do título.
Era uma vez, um incêndio florestal na lindíssima ilha da Madeira. Esse incêndio cresceu e ganhou magnitude, em zonas de difícil (ou nulo) acesso, progredindo durante vários dias, com apenas 1 (UM) meio aéreo a apoiar as equipas em terra, também elas escassas e com imensa dificuldade no combate pois as características de relevo, inclinação, clima, etc, ditavam que este teria de ser apeado e com imenso perigo na progressão. Eis que, ao fim de uns dias, e após recusar apoio do continente numa fase inicial (só isto já me tira do sério, mas adiante) lá o "manda-chuva" da coisa (segundo sei é o Presidente do Governo Autónomo, já agora) lá decidiu deixar virem mais uns fardaditos numa FOCON (mais uma sigla linda pá, esta é Força Conjunta) composta por elementos da FEPC (não portistas, não são jogadores vossos), UEPS-GNR, BOMBEIROS (decidi pôr assim, afinal as outras também estão a maiúscula hihi), ANEPC, INEM, etc. para tentar ajudar os compreensívelmente desgastados Bombeiros da RAM (Região Autónoma da Madeira, esta é de Geografia 7ºAno) que já tinham vários dias de combate no corpo. Começou então o "Bailarico das TV's e dos Comentadores Experts". Estes, grupo que age quais aves de rapina sobre quaisquer assunto (os chamados "Tudólogos") depressa decidiram qual era a solução divina para acabar com um incêndio com estas especificidades: OS CANADAIR! O famoso Avião de Combate a Incêndios que Portugal... Não tem. (Ah, não espera, tem dois... mas são alugados... ou são da FAP... mas agora compraram mais 4... mas só chegam daqui a 5 anos... bem, temos pouca coisa vá. Que aquilo é carote e a gasolina não anda barata e um bichito daqueles ainda bebe um bocado aos 100. E se o piloto tiver pé pesado... ui, meio depósito não chega para ir a Fátima.) Bem, estava encontrada a solução, e visto que o nosso vizinho aqui ao lado tem uns quantos (Chamam-lhes Exército del Aire, os brincalhões. Só porque têm 2 ou 3 dúzias deles...) a gente como bom vizinho lá foi perguntar aos Espanhóis se emprestavam um ou dois.


Isto seria o fim da história se tudo fosse no Continente. "Eles vieram, ajudaram imenso e em 1 dia apagaram tudo e pronto, felizes para sempre." SÓ QUE NÃO.
Alguém na sala de gestão desta coisa toda se esqueceu de perguntar aqueles pormenores que mencionei acima (Relevo, Inclinação, Ventos, etc) para perceber qual era a eficácia destes meios de envergadura considerável (6 a 7mil litros de água, dizem os entendidos) num incêndio maioritariamente constituídos por serras, que se incluem um dos pontos mais altos do país (e que ardeu também). PIOR! Aquando da chegada, aperceberam-se do 2º problema, que até o pessoal do Bombeiral nos Facebooks e Instagrams desta vida já tinham alertado: NÃO HÁ ZONAS SCOOPING NA MADEIRA! (O scooping, meus fofos, é aquela manobra toda fixe que o Canadair faz de andar mesmo em cima da água sem afundar, que é como ele abastece a água. Como Jesus fez na Bíblia, percebem? Pronto, continuando...) e isso quer dizer que ele ou abastece no mar (se este o permitisse, afinal de contas, é o Oceano Atlântico) OU seriam abastecidos em terra (com a ajuda de tanques e bombas de água ou veículos-tanque de Bombeiros). Escusado será dizer que foi a 2ª opção, né?

E pronto, á boa maneira do "desenrasque tuga" (ou não fosse aqui que a palavra se inventou) vieram 2 Canadair Espanhóis, que além de terem de aterrar, carregar, levantar, deslocar-se ao incêndio, descarregar e voltar ao mesmo, (o que limita imenso o tempo de autonomia de trabalho) ainda (podem rir) tinham de fazer as descargas a uma altitude tão elevada que sobram imagens e videos a mostrar que os 6mil litros ao chegar cá abaixo não passam de orvalho, ou pior, não acertam no alvo (reduzindo a eficácia e o primordial objetivo do seu empenhamento). Mas hey! Pelo menos as televisões já puderam ter os seus 20min de filmagens do Canadair a trabalhar. A extinção do incêndio (E AS FORÇAS TERRESTRES) ficou para 2º plano.

Contudo, admirem-se, ainda há quem defenda que isto foi uma boa estratégia. Como se não houvesse outra opção. Curioso, tenho em crer que helicópteros podem trabalhar muito melhor e com menos limitações numa situação destas. Outra opção são os Air Tractor (Os Fireboss, gosto mais deste nome, tem mais pinta!) que têm provas dadas nas serras do continente e especialmente nas zonas mais íngremes do Norte e Interior do País. Pois, mas esses não têm pinta nenhuma na TV, são pequenitos, muito rápidos e não dão cenário... aff, esqueci-me disso.

Com tudo isto, os nossos (BRAVOS!) Bombeiros e demais APC's em terra (a fazer o real trabalho de extinção) lá andam há 11 dias. Bem, pode ser que para a semana chamem os BERIEV ou aquele Boeing 747 que anda nos Estados Unidos para resolver a coisa e eles possam voltar a casa. Entretanto, FORÇA MEUS BRAVOS, VOCÊS SIM, SÃO O CENTRO DO SUCESSO DA OPERAÇÃO!! Desculpem, entusiasmei-me novamente.

Sabes que mais? TOCA A SIRENE!!

P.S.: A foto de fundo é da SIC Notícias, do Canadair a descarregar na Madeira... mesmo em cheio... no nada. Ups!

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